25/04/2009

Quando o belo também é despedida.



Não há por que fugir da tristeza.
Há momentos em que ela é uma amiga verdadeiramente fiel.


Hoje quero falar da tristeza.
Não me perguntem por que, pois eu mesmo não sei.
A tristeza vai chegando de mansinho e espalhando seu perfume de jasmim pelas coisas, até que todas ficam encantadas pela beleza que nela mora.
A tristeza é sempre bela, pois ela nada mais é que o sentimento que se tem ante uma beleza que se perdeu...
Visitei lugares de minha infância e vi que a casa velha onde morei não existe e nem a jabuticabeira que reguei.
Fiquei ali diante dessas ausências.
E percebo que tristeza é isso: estar diante de um espaço onde um dia houve o encontro.
Saber que, cedo ou tarde, tudo o que está presente ficará ausente.
As pequenas despedidas apenas acordam em nós a consciência de que a vida é uma despedida.
Tristeza é isto, quando o belo e a despedida coincidem.




Um por do sol...e estamos perdidos de novo. (E. Browning)
A percepção de que a beleza é crepúsculo.
Aos poucos, as coisas vão nos abandonando.
O por do sol é triste porque nos conta que somos como ele: infinitamente belos em nossas cores, infinitamente nostálgicos em nosso adeus.
A tristeza é o espaço entre o belo e o efémero, de onde nasce a poesia.




Exercício de saudade, tornar de novo presente um passado que se foi.
"Saudade é o revés de um parto, é arrumar o quarto para o filho que morreu..."
E só agora Drummond, que compreendo o que você diz no seu poema Ausência, onde você afirma não lastimar o espaço vazio.
Acontece que, depois da partida, fica a ferida que não se deseja curar, pois ela traz de novo a memória o belo que uma vez foi."

Por muito tempo achei que ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não o lastimo.
Não falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços, que rio e danço e invento exclamações alegres, porque a ausência, essa ausência assimilada, ninguém a rouba mais de mim...
Não é estranho isso, que na tristeza more a beleza, e que se encontre ai mesmo um pouco de alegria?
É mais bonita a dor de quem arruma o quarto para o filho que já morreu, que o vazio/ vazio de quem não tem nenhum quarto para arrumar.
Brinco com a minha tristeza como quem cuida de uma amiga fiel...

(Rubem Alves)

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